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“Era trabalhador, negro e corria para pegar o ônibus”: mais um jovem morto pela violência policial no Brasil

Guilherme Dias Santos Ferreira, de 26 anos, foi executado com um tiro na cabeça por um policial militar de folga, na Zona Sul de São Paulo, na noite de sexta-feira, 4 de julho de 2025. O jovem, negro, casado, religioso e trabalhador, corria para não perder o ônibus após um dia de serviço. Foi confundido com um assaltante e morto.

A tragédia se soma a uma lista dolorosa de vidas negras ceifadas por uma estrutura policial racista e impune. O Instituto de Cidadania e Direitos Humanos (ICDH) se solidariza com a família de Guilherme e exige justiça.

O caso: “Ele só estava voltando do trabalho”

Guilherme era marceneiro e atuava há quase três anos em uma fábrica de móveis em Parelheiros, Zona Sul da capital paulista. No dia do crime, havia saído do trabalho às 22h28. O ponto de ônibus ficava a poucos metros dali. Quando corria pela estrada mal iluminada, foi alvejado pelas costas por um policial militar de folga, que alegou tê-lo confundido com um dos suspeitos de uma tentativa de assalto momentos antes.

Segundo a própria esposa da vítima, Sthephanie dos Santos Ferreira Dias, Guilherme carregava apenas a mochila com a marmita e um livro da igreja.

“Só porque é um jovem negro, preto e estava correndo para pegar o ônibus, ele atirou”, declarou, emocionada. “Ele me deixou um beijo antes de sair para o trabalho. Nem sabia que era o último.”

O disparo atingiu a cabeça de Guilherme. Ele morreu na hora. Uma mulher que passava pela rua também foi baleada e sobreviveu.

“Homicídio culposo” ou execução sumária?

O autor do disparo, o cabo Fábio Anderson Pereira de Almeida, foi preso em flagrante e liberado após o pagamento de uma fiança de R$ 6.500. A tipificação inicial do crime foi de homicídio culposo – sem intenção de matar.

No entanto, para especialistas em segurança pública e direitos humanos, a decisão contraria os próprios fatos: Guilherme foi baleado na cabeça, pelas costas, em circunstância que configura homicídio doloso, com intenção ou, ao menos, com total desrespeito à vida.

“Quem atira na cabeça de alguém que está correndo e desarmado age com dolo. Essa é uma prática recorrente contra corpos negros no Brasil”, declarou um pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Racismo institucional e a construção do inimigo

O assassinato de Guilherme não é um caso isolado. Ele está inserido em uma lógica de racismo institucional que criminaliza e condena, à primeira vista, pessoas negras, sobretudo homens jovens, periféricos e trabalhadores.

Relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2024 revelou que mais de 80% das vítimas de mortes decorrentes de intervenções policiais no Brasil são negras. A seletividade racial do uso da força letal é evidente — e reforçada pela impunidade.

Para o ICDH, é urgente desnaturalizar a narrativa do “erro trágico” e compreender esses crimes como parte de um padrão sistemático de violência do Estado contra a população negra. Guilherme não foi morto por engano. Ele foi morto porque é negro, correndo à noite, carregando uma mochila. O estereótipo o condenou à morte.

Justiça para Guilherme

O ICDH se junta à família de Guilherme, à comunidade de Parelheiros e às vozes que exigem:

  • A reclassificação do crime como homicídio doloso;
  • A responsabilização integral do autor no âmbito criminal, disciplinar e cível;
  • A criação de protocolo obrigatório de identificação e contenção em ações de segurança por parte de policiais de folga;
  • Formação antirracista obrigatória nas corporações policiais;
  • E o fim da lógica de “guerra” contra a população negra nas periferias brasileiras.

Não é tragédia, é projeto

Casos como o de Guilherme são tratados como exceções, mas repetem padrões históricos. Assim como Genivaldo de Jesus Santos, Cláudia Ferreira, João Pedro, Ágatha Félix, George Floyd, e tantos outros, Guilherme se tornou mais uma vítima de um sistema que mata primeiro e pergunta depois — se perguntar.

Enquanto isso, a juventude negra segue sendo alvo prioritário da violência policial no país que mais mata pessoas negras no mundo.

O ICDH reafirma seu compromisso com a vida, a justiça racial e o combate à impunidade. Guilherme tinha nome, história, sonhos e família. Ele merece justiça — e sua morte não pode ser em vão.

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