Por Vander Cherri- ICDH
Atualmente o mundo assiste a proliferação de conflitos armados e suas devastadoras consequências humanitárias. É preciso sensibilizar a opinião pública e os líderes mundiais sobre a urgência de cessar as hostilidades e proteger as vidas de civis inocentes, que são as maiores vítimas dessas guerras. A situação atual, marcada por um número alarmante de conflitos em diversas regiões do planeta, exige uma resposta coordenada e eficaz da comunidade internacional, a fim de garantir o respeito aos direitos humanos e o cumprimento das normas do direito internacional humanitário. É imprescindível que as autoridades responsáveis por esses conflitos sejam responsabilizadas por suas ações, e que medidas concretas sejam implementadas para prevenir futuras atrocidades e promover a paz e a segurança globais.
De acordo com dados recentes divulgados pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) em 2024, o cenário global de conflitos armados é alarmante e exige atenção imediata. Atualmente, existem 120 conflitos armados em curso em todo o mundo, envolvendo diretamente 60 dos 193 Estados reconhecidos pelas Nações Unidas. Esses números revelam que aproximadamente 31% dos países do mundo enfrentam situações de conflito armado, o que representa uma crise humanitária de proporções globais. A persistência desses conflitos resulta em um sofrimento incalculável para milhões de pessoas, incluindo crianças, mulheres e idosos, que são frequentemente as vítimas mais vulneráveis da violência e da instabilidade. É imperativo que a comunidade internacional intensifique seus esforços para promover a resolução pacífica de conflitos e garantir a proteção dos civis em áreas de guerra.
A escalada da violência e a intensificação dos conflitos armados têm gerado um impacto devastador sobre as populações civis, resultando em um aumento significativo no número de mortos, feridos, deslocados e refugiados. As guerras causam a destruição de infraestruturas essenciais, como hospitais, escolas e sistemas de saneamento, dificultando o acesso a serviços básicos e agravando as condições de vida das pessoas afetadas. Além disso, a violência sexual, o recrutamento de crianças-soldados e outras formas de violência de gênero são utilizadas como táticas de guerra, causando traumas profundos e duradouros nas vítimas. Diante desse cenário desolador, é fundamental que a comunidade internacional adote medidas urgentes para proteger os civis em áreas de conflito, garantir o acesso à assistência humanitária e promover a responsabilização dos autores de crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
As resoluções da Organização das Nações Unidas (ONU) condenam veementemente qualquer tipo de massacre de civis e instam os Estados membros a adotarem todas as medidas necessárias para prevenir e punir tais atrocidades. No entanto, a impunidade persiste como um dos principais desafios na luta contra a violência em conflitos armados. É crucial que os responsáveis por crimes de guerra e crimes contra a humanidade sejam levados à justiça, a fim de garantir que as vítimas recebam reparação e que a cultura da impunidade seja combatida. A Corte Penal Internacional (CPI) desempenha um papel fundamental nesse sentido, investigando e processando indivíduos acusados de cometer os crimes mais graves de preocupação para a comunidade internacional. No entanto, é necessário fortalecer a cooperação entre os Estados e a CPI, a fim de garantir que todos os autores de atrocidades sejam responsabilizados por seus atos.
Diante da gravidade da situação, este parecer jurídico tem como objetivo principal sensibilizar os eleitores sobre a importância de exigir o fim dos conflitos armados em todo o mundo, a fim de resguardar a vida de inocentes, incluindo crianças, mulheres e idosos. É fundamental que os cidadãos exerçam seu direito de voto de forma consciente e responsável, escolhendo líderes comprometidos com a promoção da paz, a defesa dos direitos humanos e o respeito ao direito internacional humanitário. Além disso, é importante que a sociedade civil se mobilize e pressione os governos a adotarem políticas que visem a resolução pacífica de conflitos, o desarmamento e a promoção do desenvolvimento sustentável. Somente através de um esforço conjunto e coordenado será possível construir um mundo mais justo, pacífico e seguro para todos.
Des Palestiniens marchent sur une route de terre bordée de décombres de bâtiments détruits dans le quartier de Shujaiya, situé dans la ville de Gaza, le 7 octobre 2024. © Omar al-Qattaa, AFP
Da Responsabilidade de Proteger e da Cooperação Internacional
A complexidade do cenário global, caracterizado pela proliferação de conflitos armados e pela crescente vitimização de civis, impõe uma reflexão sobre a Responsabilidade de Proteger (R2P) e a necessidade de cooperação internacional para mitigar o sofrimento humano decorrente dessas crises. A R2P, embora não codificada em um tratado internacional específico, emergiu como um princípio orientador do direito internacional, fundamentado na soberania como responsabilidade.
Nesse contexto, a comunidade internacional, e cada Estado individualmente, detém o dever de proteger as populações contra genocídio, crimes de guerra, limpeza étnica e crimes contra a humanidade, flagelos que invariavelmente acompanham os conflitos armados. A inação diante de tais atrocidades não pode ser tolerada, sob pena de comprometer os valores fundamentais da dignidade humana e da coexistência pacífica entre as nações.
A R2P se manifesta em um espectro de ações, que vão desde medidas preventivas e diplomáticas até, em último caso, a intervenção, sempre em consonância com os princípios e propósitos da Carta da ONU. A solução para os conflitos armados e a proteção de civis demandam a cooperação entre Estados, organizações internacionais e a sociedade civil.
O Brasil, em consonância com sua tradição diplomática, pode e deve desempenhar um papel ativo na promoção da paz, na mediação de conflitos e no apoio às vítimas da violência armada. A Constituição Federal, em seu artigo 4º, inciso IX, estabelece como princípio das relações internacionais do Brasil a “cooperação entre os povos para o progresso da humanidade”, demonstrando o compromisso do país com a busca por um mundo mais justo e pacífico. Além disso, o artigo 4º, inciso VI, da Carta Magna, prega a “defesa da paz” como um dos pilares da atuação do Brasil no cenário internacional.
A análise das normas constitucionais revela que o Brasil possui um arcabouço jurídico favorável à atuação em prol da paz e da proteção dos direitos humanos no cenário internacional. A cooperação com outros Estados e organizações internacionais é fundamental para o sucesso de iniciativas que visem a prevenir conflitos, proteger civis e promover a responsabilização por crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
A gravidade da situação, com a proliferação de conflitos armados e o sofrimento de milhões de pessoas, exige uma resposta firme e coordenada da comunidade internacional, na qual o Brasil deve desempenhar um papel de liderança. A omissão ou a inércia diante de tais atrocidades representariam uma afronta aos valores mais elementares da humanidade e uma grave violação dos princípios que regem a ordem internacional.
Dos Crimes de Guerra e Crimes contra a Humanidade: Jurisdição e Responsabilização
A proliferação de conflitos armados em escala global, conforme demonstrado pelos dados do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), revela um cenário preocupante de violações generalizadas do Direito Internacional Humanitário (DIH). Atrocidades como massacres de civis, ataques deliberados contra populações não combatentes, o uso de crianças-soldado e outras violações graves do DIH configuram crimes de guerra e crimes contra a humanidade, atraindo a atenção da comunidade internacional e demandando a responsabilização dos perpetradores.
A responsabilização por crimes de guerra e crimes contra a humanidade encontra amparo no Estatuto de Roma, tratado que instituiu o Tribunal Penal Internacional (TPI). O artigo 5º do Estatuto de Roma estabelece a competência do TPI para julgar crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e o crime de agressão.
O artigo 7º define crimes contra a humanidade como “qualquer um dos atos seguintes, quando cometido no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, e com conhecimento desse ataque”, incluindo assassinato, extermínio, escravidão, deportação ou transferência forçada de população, prisão ou outra privação grave da liberdade física que viole as normas fundamentais do direito internacional, tortura, violência sexual, perseguição de qualquer grupo ou coletividade identificável por motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais, religiosos, de gênero ou outros motivos universalmente reconhecidos como inaceitáveis em conformidade com o direito internacional, desaparecimento forçado de pessoas, o crime de apartheid e outros atos desumanos de caráter semelhante que causem intencionalmente grande sofrimento ou afetem gravemente a integridade física ou mental.
Já o artigo 8º define crimes de guerra como “violações graves das Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949, a saber, qualquer um dos seguintes atos contra pessoas ou bens protegidos nos termos das disposições da Convenção pertinente”, incluindo homicídio doloso, tortura ou tratamento desumano, incluindo experiências biológicas, causar intencionalmente grande sofrimento ou ofensas graves à integridade física ou à saúde, destruição e apropriação de bens, não justificadas por necessidades militares e executadas em grande escala, ilícita e arbitrária, obrigar um prisioneiro de guerra ou outra pessoa protegida a servir nas forças de uma potência inimiga, privar intencionalmente um prisioneiro de guerra ou outra pessoa protegida do seu direito a um julgamento justo e imparcial, tomada de reféns, e dirigir intencionalmente ataques contra a população civil ou contra civis que não participem diretamente nas hostilidades.
A análise dos dispositivos do Estatuto de Roma demonstra a amplitude da definição de crimes de guerra e crimes contra a humanidade, abrangendo uma vasta gama de condutas que atentam contra a dignidade humana e a ordem internacional. A competência do TPI, embora fundamental, não é exclusiva, cabendo aos Estados nacionais investigar e julgar os responsáveis por tais crimes, em consonância com suas obrigações internacionais.
A constatação de que uma parcela significativa dos países do mundo enfrenta situações de conflito armado impõe a necessidade urgente de fortalecer os mecanismos de responsabilização por crimes de guerra e crimes contra a humanidade. A atuação do Tribunal Penal Internacional, embora fundamental, não é suficiente para abarcar a totalidade dos casos. É imprescindível que os Estados nacionais, em consonância com suas obrigações internacionais, investiguem e julguem os responsáveis por tais crimes, garantindo que a justiça seja feita e que as vítimas recebam a devida reparação. A promoção da justiça e da responsabilização é um passo crucial para a construção de uma ordem internacional mais justa e para a prevenção de futuras atrocidades, reafirmando o compromisso da comunidade internacional com a proteção dos direitos humanos e a dignidade da pessoa humana.
Prédio bombardeado por Israel em Gaza: relatos à CNN apontam que ataques não estão mais sendo alertados • REUTERS/Ashraf Amra
Por Vander Cherri